Se na conjunção das mais potentes forças cósmicas ele canalizou seu sei-lá-o-que de corpo e alma para o benefício exclusivo dela, ninguém em sã consciência, nem mesmo em dimensões paralelas hipotéticas, julgaria o esforço indigno sequer de menção-honrosa; mas ela o fazia, e com que maestria e graça espezinhava a vertente de suas mais caras e condoídas lágrimas. Não se poderia chamar aquilo de inexperiência, nem ainda de ingenuidade, mas dele se extraía sem moderação o cúmulo de um altruísmo que chegava a incomodar os anjos. Como em detrimento de si mesmo ele re-escolhia a ela, a ela, a ela... Ainda que a vida se esvaísse, a vida continuava sendo-a, e ele a entronizaria mesmo sem resposta e sem remorso.

Do alto de sua indiferença, ela se ocupava com a repetida lamentação de seus próprios ais. Não que alguém pudesse culpá-la; e ainda que pudesse, ela seguiria indomavelmente seu próprio curso, fadada a um destino autodeterminado o qual, se convencera, era inescapável. Um condenado polindo as próprias algemas, era ela acorrentada à incapacidade de investir fé na própria felicidade.

Até poderia ter havido um final feliz, mas toda a energia positiva aplicada naquela congruência se dissipara no agigantamento de muralhas, na focalização dos obstáculos, no pessimismo prático, na não aceitação, no tédio sem remédio. E da profundeza de um fosso abismal, todas as futuras gerações ainda ouvirão ecoar a desanimada e rouca canção do que fora, um dia, um poeta:

-Eu teria feito mais que tudo,
Mais que pena e sonho e versos mil;
Mas, como sempre foi no nosso reino do absurdo,
Você "decidiu"...