Vejo através da velha cortina
Que ao meu palco serviu como enfeite
Um passado de amargura infinda
Onde em nada encontrei deleite
 
Vivi sonhei me embriaguei
Tombei caí e fui ao chão
Passei os anos que me foram impostos
Entre amargura e decepção
 
Porém cheguei à octogenária
Com brio caráter e honradez
Enfrentei de fronte erguida
Pobreza fome frio e nudez
 
Tiritei nas duras intempéries
Nas estradas sombrias que passei
Arrastando-me ao chão do meu calvário
E subindo escadarias desabei
 
Caí por terra na terceira idade
Onde a desventura arruinou-me a vida
Vejo-me a cada dia mais inútil
E sem préstimo algum sou esquecida
 
Velha é peça inútil e desgastada
Até os frutos que dei fogem de mim
Iludem-se com teres e haveres
Nem vêm que meus dias chegam ao fim
 
Ingratidão e descaso são o lucro
De tudo que na terra com amor plantei
Amanhã estes jovens serão velhos
E passarão também o que passei
 
Espero na promessa do Altíssimo
De um dia ser por Ele consolada
Na partida certa que me aguarda
Com certeza serei recompensada.

MARIA AGLAIDE NEVES
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