(Curitiba, 02/07/2004)

Estou carente de vozes, zunzuns, balbúrdias,
vocês todas, de repente, ficaram mudas;
já não mais suporto esta monotonia

e estas teclas ásperas e frias
do teclado insensível e quadrado,
sem vida, objeto abjeto, tapado,
que passa a meu lado, os dias.

Avoluma-se-me uma interminável ausência
de seres singulares e compostos
de carnes, veias, vasos, vozes e ossos;

Complexos: ora, de beatitude; ora, de indecência
cheios de pecados e de pensamentos e de pudores,
rasos os olhos de risos e de choros e de amores,

Que já quase me entrego à demência,
longe assim de falas, de peles, de cabelos e de vistas
não mais caibo neste mundo de capitalistas,

Doutos da ruptura humana e da reticência,
que cerceiam a carícia e o laço e o choque carnal,
quase nos levam a uma viagem banal e infernal,

Pois que nos lavam o sentido e extraem a essência,
fazendo de todos uma corveta distante do porto,
em moderníssima e inexplicável máquina torna-se o corpo.

No entanto, sem préstimos, posto que vivência
abalroada de compromissos dos negócios,
na verdade, é apenas isso: um pacote de instantes beócios.

Todavia, ainda que cedo nos acordermos, o tempo na Terra
já se terá esgotado e, lá na vida eterna
perdurará, contudo, a irrevogável falta da presença

De pessoas, psius, pausas, pernas, prantos,
vozes, velas, vindas, voltas, violas e cantos
reservados ao apego, ao afago, à quase concupiscência.

Vivamos, enquanto há energia e sinergia e alegria no físico
que alimenta os órgãos vitais e o espírito
e supre a tênue linha da ausência.