KEW  GARDENS

“ Faz quinze anos que estive aqui com Lily”, pensava ele. “ Sentamo-nos à beira de um lago por ali e eu, durante toda a tarde quente, pedi que ela se casasse comigo. Em torno de nós, circulando sem parar, um louva-a-deus: que agora vejo tão claramente como o sapato dela, com uma fivela quadrada e prateada na ponta. O tempo todo em que eu falava, olhava para o sapato e, quando impacientemente ele se mexia, eu sabia sem olhar para cima o que ela iria dizer: toda ela parecia estar no sapato. Já meu amor, meu desejo estavam no louva-a-deus; por alguma razão eu pensava que, se ele pousasse lá, naquela folha, a folha larga com uma flor vermelha no meio, se o louva-a-deus pousasse ali ela iria dizer ‘Sim’ sem pestanejar. Mas o louva-a-deus voava sem parar, nunca pousou em canto algum - felizmente aliás, porque senão eu não estaria passeando por aqui com Eleanor e as crianças. – Você às vezes pensa no passado, Eleanor?

“ Por que a pergunta, Simon?”

"Porque eu andei pensando no passado. Lembrei de Lily, a mulher com quem eu poderia ter-me casado... Mas por que você ficou tão calada? Importa-lhe que eu pense no passado?”

“Mas por que importaria, Simon? Não pensamos todos nós no passado, num jardim com homens e mulheres sob as árvores? Não são eles o nosso próprio passado, tudo o que resta dele, esses homens e mulheres, esses fantasmas que jazem sob as árvores...nossa felicidade, nossa realidade?”


Virginia Woolf- CONTOS COMPLETOS ( Kew Gardens - pág . 116)
Editora Cosac Naify - Tradução Leonardo Froés

Eloisa Alves
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