Quando minha filha nasceu, não me tornei mais uma desgraçada mãe solteira, me tornei PUTA; Quando apelei à justiça pelos direitos dela, fui rechaçada, uma velha professora me mandou criar vergonha na cara. "Sabia que ele era casado, agora quer tirar dinheiro da família do coitado? Ele tem filhos com a esposa, e ela não vai aceitar isso, guria! Tais doida?". Meus filhos receberam pensão, sim, de acordo com a legislação. É preciso honrar as conquistas de mulheres que se importam. Entendem?... Quando rejeitei candidatos a "salvar" minha reputação, todos diziam ter me comido e "saído fora"; Quando eu aparecia com um namorado, logo as vozes se erguiam uníssonas:: "Tá na cara que ele só quer ela pra comer e jogar o bagaço fora". Ora! Eu era uma PUTA MÃE SOLTEIRA e ele queria experimentar - certamente eu me prestava a todas as suas exigências sexuais; Quando entrei para a faculdade, não estava estudando nada, estava era fazendo programa. Inclusive nesse período descobri ter feito dois abortos. Sim, um aborto seria pouco, mas dois foram suficientes. Quando descobri tê-los feito - após uma série de ataques por consanguíneos, colegas de turma e de trabalho além de puta me tornei diabólica, um péssimo exemplo como professora; Quando eu esperava o ônibus sozinha num ponto deserto, por volta das 23 horas, para finalmente voltar para casa, na zona rural da cidade, triste por saber que encontraria minha filha dormindo, exausta depois de um dia de trabalho e estudo, percebi uma movimentação estranha, carros conduzidos por motoristas machos e fêmeas, buzinando, passando devagar. Alguns me ofereciam carona, me chamavam para um "passeio", ou só faziam um sinal para entrar e seguir. Havia conhecidas e conhecidos me espionando sorrateiramente, inclusive flagrei uma professora me fotografando... Acreditaram ter como provar: se tratava de uma PUTA PROFISSIONAL, e fazia programa enquanto minha mãe sofria cuidando da neta; Quando morei com um namorado e engravidei de meu segundo filho, a família dele me orientou a doar minha filha aos meus pais para que fosse possível seguir com o casamento, afinal ele era um rapaz jovem, bonito, solteiro, merecia alguém em situação semelhante... Foram três anos infernais, diversas separações e voltas. Ele rasgava minhas calcinhas se as considerasse pequenas; vestia minhas roupas rasgando-as também. Não demorou muito para eu me encontrar usando camisetas dele como vestido. Certa vez jogou um Baudelaire no lixo. "Qual a razão de eu ler aquelas merdas. Já não era louca o suficiente?". Por que permiti? Eu não permitia, eu o enfrentava, sempre o enfrentei, lutei muito, o Baudelaire não ficou no lixo, eu o li, Flores do Mal. Foi um período difícil de minha vida. Diziam para eu pensar no menino, diziam que ele mudaria, amadureceria, e eu persisti enquanto me foi possível, tornando o fim muito mais dramático. Eu não doei minha filha, segui minha vida com meus dois filhos; com meus dois filhos rejeitados por seus pais, crianças perplexas diante dos preconceitos incompreensíveis para mim, preconceitos também manifestados contra eles nas Unidades de Saúde, nas escolas, nos aniversários de sobrinhos - isso quando os convidavam. Não há delírios aqui! Quando eles foram para a escola, não faltou assédio, sondagens maliciosas, tentativas de manipulação contra mim, se iam de uniforme, não tinham outra roupa para vestir, voltavam com doações, peças enormes para eles, furadas, manchadas; se iam com roupas de passeio, recebiam advertência para eu assinar - três advertências para uma suspensão, avisavam. Minhas crianças tinham roupas, se fosse o caso, eu deixaria de comprar para mim, elas foram muito bem cuidadas sempre. Meu filho terminou o ensino médio noutra cidade, pois, quando estudou na cidade onde nasceu, reprovou, por não aceitar as investidas contra ele, contra mim, contra nós. De personalidade semelhante a minha, se declarou ateu aos dez anos e isso os revoltou ainda mais, quando fui chamada à escola para conversar sobre o assunto. Se era verdade ou ele estava mentindo. Eu respondi: sou ateia, ele pensa como eu, talvez pense diferente um dia, não sou eu quem irá decidir, e decidiu ser ateu - e continua ateu. Sobre a reprovação, ele havia adiantado um ano de sua vida escolar com a implantação do ensino fundamental de nove anos, e ficou tudo certo, claro, para a decepção da perversidade inserida no meio pedagógico. Covardes! Lembro-me dos rótulos impressos por alguns professores: "o filho da outra, o debochado...". Quando minha filha engravidou, solteira como eu, logo teve início uma série de ataques idênticos aos sofridos por mim. Afinal a história deveria se repetir. "Viva!". Mas nós dissemos: NÃO! E NÃO! E NÃO! Porque todas as famílias que conhecíamos tinham, e têm, suas PUTAS; algumas são putas exclusivas, de um machista só. Vivem infelizes, mas se dizem casadas e de respeito. Muitas são estupradas com frequência por seus maridos, mesmo enquanto dormem, depois de uma jornada dupla, tripla... de trabalho - Preciso dizer: o estupro durante o sono é uma barbárie ignorada, muitas vezes comentada com normalidade entre as heroínas do lar como algo natural, afinal é seu cônjuge quem a está estuprando, são mulheres casadas, mães do lar. Mulheres de respeito raramente são estupradas, isso é mais comum entre putas, putinhas, putonas... Aliás, algumas dessas digníssimas senhoras são putas religiosas, fodem com vários servos de Deus em nome de Jesus, e gozam gritando: Aleluia! Aleluia! Outras são putas que adoram sair com rapazes mais jovens, com quem vivem os melhores momentos de suas vidas e têm seus melhores orgasmos, ou únicos, pois costumam fingir para seus maridos em suas transas à papai e mamãe. São cúmplices perniciosas do patriarcado, por isso jamais as defendo. Muitas delas me apedrejaram o suficiente para que eu tivesse certeza do quanto são repugnantes, perversas, infelizes, invejosas... Sórdidas a ponto de envolver outra mulher nas mais terríveis experiências em nome de uma moral falsa, catastrófica, criminosa. Seus maridos infiéis, não raramente, fodem com outras mulheres e outros homens. Se sabem ou suspeitam? Muitas, sim, mas fingem, em benefício próprio, que não. Esses potros são muitas vezes os principais provedores da casa, Por isso, é deles o melhor carro; partem deles as principais decisões da família, de suas vidas. Por fim, quando perceberam o quanto eu havia me fortalecido ao me defender e enfrentar suas conspirações veladas, passaram a agir de um modo bastante vulgar, mas sobre isso, nem irei comentar, é desprezível, embora cômico. Elas continuam a defender suas rePUTAções. Assim como eu, uma ex-puta, defendo as putas, contra essas tais inimPUTÁveis.

Um poema confessional, nada além.

Penha, SC

Tereza Du\'Zai
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