CONSEQUÊNCIA DOS BOLINHOS DE CHUVA

A triste conseqüência dos bolinhos de chuva

 

 No passado, com problemas desde a  sola dos pés ao ultimo fio de cabelo achei por bem enveredar pelo caminho do aprendizado de feitiçaria, magia negra e branca e coisas afins. E, todos sabem, o bom aluno sempre quer superar o mestre. Eu não queria superar o mestre, mas os mestres.  Depois de muito ler sobre o assunto, visitar uma patota de pais e mães de santo, até um nipônico egresso da Seicho-no-iê que fazia macumba com caldo Knnor de frango caipira  e sushi, reunião com macumbeiros e gente da mais variada ralé achei que estava nos trinques. Dali em diante faria tudo para ser o Merlin do mundo moderno, casando e descasando, ajuntando e separando, enriquecendo e empobrecendo, curando e adoentando, estiando e fazendo chover e por ai vai.  São inúmeras as possibilidades de um mago. Se vão dar certo é outro departamento. 

Para chegar no top do conhecimento mágico visitei tudo quanto é encruzilhada do município, fui a cemitérios meia noite, falei com padres, espíritas, pastores, adivinhos, benzedores, curadores, médicos, bêbados, abitolados, néscios e fui, em horários despropositados a córregos,  cachoeiras,   rios da região,  as montanhas. Enfim, depois de tanta luta,  tapeado por uma fanfarrona  (a famosa Chapeuzinho, que não era vermelho, mas encardido) achei-me pronto a intervir no destino humano através de meus conhecimentos (?) secretos. Para coroar fiz o famoso curso por correspondência “A Arte Absoluta da Feitiçaria”  no Instituto Padrezeus com direito a certificado de conclusão de curso e cartões de visita grátis  Nem cheguei a armar minha tenda apareceu minha primeira vitima, corrigindo, consulente.

Bem, Zena, minha conhecida veio aconselhar-se. Obviamente ela não sabia que eu era detentor da milenar arte de enganar, digo,  solucionar casos corriqueiros como o que ela apresentou. Tratava-se de sua filha Narinha, apaixonada pelo mano   Zezinho Crustáceo, nome formado por sete vogais e oito consoantes, que não dava a mínima atenção a ela. Contava-me:

- E não é que o talzinho se acha, nem olha pra Narinha? Ele passa e ela segue com aquele olhar de anjo pedindo carona (Ah, o amor de mãe!), diz um psiu adocicado e ele finge que surdez é o seu negócio, se manda um bilhete ele dá uma de analfabeto, difícil chamar a atenção desse Zezinho. Outro dia pra ser notada Narinha até o atropelou de bicicleta e o garoto pediu desculpas por ter se colocado no seu caminho. Chegou em casa chorosa e indagativa: - Manhê, qui que eu faço prele me notar?  Vai daí vim procurar seu aconselhamento. 

Matutei, matutei,  resolvi tomar o caminho mais curto. Disse a Zena não se preocupasse. Tomasse ela os ingredientes necessários, ensinasse a filha a fazer bolinhos de chuva, pusesse uma dúzia, sem tirar nem por,  num pratinho cor de rosa enfeitado com três bem-me-quer, um arco-íris de velas, três pontas de pelo do bigode de uma gata virgem,  escolhesse uma roseira numa das praças de nossa cidade e, a meia noite mais cinqüenta e nove segundos, colocasse essa oferta debaixo da roseira, pedindo sete vezes:- “Bolinho, bolinho, traga-me o Zezinho” .

E não é que as duas, mãe e filha, fizeram o aconselhado?  Só depois do acontecido fiquei sabendo estarrecido é que,  na falta,  fritaram os tais bolinhos no óleo de rícino,  não achando uma gata cortaram as pontas de pelo de um velho gatão preto,  rueiro e notívago,  o pai não deixou Narinha sair e ela deixou a encomenda sob um pé de pimenta malagueta,  sem contar o horário atrasado em mais de uma hora dado os  improvisos.

Na noite posterior a esse ofertamento, lá pelas sete da noite, escutei um barulhão,  um ronco ensurdecedor sobre a cidade. Naquele dia aconteceu o maior temporal de que se tem noticia na cidade.

Foi granizo, relâmpago, trovão, vento, o escambau sobre a cidade, destelhamento de casas, a igreja matriz descascada com o relógio avariado, telhados de eternit  perfurados, vidros de carro estilhaçados,  industrias danificadas  e por ai afora e pior,  sem energia elétrica ficamos no escuro e acabei sonhando ser o culpado pela calamidade, encaminhamento errado do encantamento (A eterna pergunta:- Onde foi que eu errei?). Fui procurado por Zena e informado que tudo acabou  bem:

-Pois é, disse ela, depois do despacho não é que o Zezinho encantou-se pela Narinha, logo no mesmo  dia? Ai foi ela que se desencantou, notou certa vesguice no seu olhar, fora um desproposito de  orelhas  e o nariz torto para a direita, falava fanhoso quando não gaguejava, não tinha botado reparo antes. Fez descer ali mesmo grosso ponto final no seu primeiro amor. Agora diz que quer mesmo é o Manezinho.  Perguntei-lhe como fizera a magia dos bolinhos, só então fiquei sabendo do enrosco.

Resolvi desde então não brincar mais com deuses. Apelaram só por causa de umas coisinhas fora do prumo. Pedi desfiliamento imediato da  União Municipal  dos Macumbeiros, Adivinhos, Curandeiros, Tarólogos, Astrólogos, Geólogos, Ecólogos etc., etc., etc.

Dali uma semana bateram na minha porta. Abri e dei de cara com um rapazinho vesgo, orelhas repolhudas  e nariz mais a direita:

- Bom dia, sabe meu,  sou o mano Zezinho, muito a fim da  mina Nairinha  que vive  tirando minha pessoa, será que dava...

-Errou o CEP moço, respondi,  já me aposentei da atividade macumbaticia que, alias, nem comecei, passar bem. 

Fechei a porta para o passado, pensativo. Tentei resolver um caso simples e deu no que deu, se me pedissem um casamento era capaz de  desencadear o apocalipse. Resolver problemas de maneira fácil é muito difícil. Vamos deixar o futuro em paz. O que será., será.

 

 

 

 

 

BUENO
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