CRÔNICA: "A MINHA MELHOR NOITE DE ANO NOVO"

A MINHA MELHOR NOITE DE ANO NOVO

As festas de final de ano sempre me foram insatisfeitas. Sempre me davam a impressão que ficava faltando alguma coisa.

Às vezes aquelas festas com diversas famílias que não me diziam nada. Aqueles perus assados, aqueles porquinhos idem e aquele fastio na minha alma.

Quando se passava só em casa com os mais chegados também não eram lá muito estimulantes.

Sinceramente nunca vi muito motivo para tanto estardalhaço na passada do ano.

Para a maioria das pessoas normalmente tinham sido anos sem grandes novidades, mas não, lá na dita passagem,  lá estão todos, tendo sido felizes ou não, terem melhorado como pessoas isto pouco importava, o importante era o lado material e se este não tivesse sido bom, aquela comemoração funcionava como uma lavada de alma e todos com aquelas supertições de sete uvas, sete goles de champagne e por ai vai.

Como já dizia Raul Seixas eu sempre achava aquilo tudo um saco.

Acaba sempre é sobrando para o mar, coitado, já recebe tantas sujeiras durante o ano todo e ainda tem que receber todas aquelas oferendas para a deusa dos oceanos que, com certeza, pelo que a humanidade fez com o seu reduto quer é muita distância de todo ser humano.

Engraçado. O ser humano destrói tudo que ainda tem da natureza e acha que os deuses (enteais) dela ainda nos amam como bons filhos.

Mas estas festas sempre me traziam muita melancolia. Ficava triste sem saber o porquê, além de me sentir sempre muito sozinho não importando o número de pessoas que estivesse por perto.

Considerava-me um desajustado, só podia ser isto, pois todos faziam tantas festas e eu acabava indo no embalo, acabava participando, mas não via a hora de acabar e a vida voltar à sua normalidade.

Sempre foi assim, desde que me conheço por gente até que chegou aquele final de ano.

Eu havia me separado havia uns dois ou três anos depois de um relacionamento que havia durado dez anos e sem filhos.

No inicio morando num hotel a vida era a maior dificuldade, pois você não conhece mais ninguém, não tem o que fazer à noite e até se adaptar há certa dificuldade que normalmente é compensada com uma vida noturna mais intensiva.

Está eu já conhecia bem, pois fui criado nela desde muito jovem, então não tinha nenhuma novidade, nem segredos, mas era premente ter de voltar a ela novamente, não tinha outra saída.

Estava com quarenta anos e no inicio tive que encarar uma depressão danada que já vinha desde o final do relacionamento e inclusive foi o motivo principal para eu ter me afastado da minha ex-companheira. Eu saí de casa, pois estava me sentindo totalmente sufocado e sabia que ia ter de voltar a encarar os meus “demônios” sozinhos e que tinham ficado escondidos embaixo do tapete durante o casamento.

Fui à luta e necessitando de uma ajuda médica fui orientado neste período a não ficar em casa de jeito nenhum. Tinha que sair todas as noites, não importa para onde. Tinha que ter contato com pessoas todas as noites, pois de dia era mais fácil devido ao trabalho, mas que também me era muito cansativo naquele período.

E neste estimulo médico eu saia todas as noites. Ia a clubes jogar baralho, fazer saunas etc. e arranjar namoradas, ou melhor, como dizia o psiquiatra: relacionamentos de preferência sem sexo, para desenvolver de volta o prazer de se relacionar sem nenhum interesse a não ser o simples fato de desenvolver amizades afetivas.

Isto para mim foi muito importante e me ajudou muito para o meu futuro e para me tornar a pessoa que sou hoje.

Então eu não perdia oportunidade e me aproximava de qualquer mulher que desse oportunidade, só que eu não conseguia levar muito a sério os conselhos que ele dava e acabava tendo sexo, mas sabia que o orientação dele era primordial para acabar com hábitos errados que vamos desenvolvendo ao longo da vida e ao mesmo tempo nos afastando daquilo que a mulher pode nos dar de melhor que é a sua amizade, a sua afeição, o seu carinho, o companheirismo, além de uma vida marital normal.

E eu abria o jogo para a maioria delas. Dizia que estava em tratamento e que a orientação era esta e, para minha surpresa, você não imagina como as mulheres são compreensivas quando você é sincero. E aí descobri que assim elas gostavam bem mais de mim.

Com certeza tanto o homem como a mulher perderam muito quando começaram a colocar o sexo como o principal para o relacionamento.

E nesta dita saia toda noite. Estava com uma condição financeira boa e não precisava acordar cedo para ir trabalhar então ia à luta.

E entre estas mulheres que eu me relacionava sempre tinha uma que se tornava a mais próxima e era com quem eu acabava saindo mais e passando os domingos, mas sem compromisso.

Às vezes eu ficava em casa sossegado. Como era gostoso. Pedia uma comida e ficava no apartamento sozinho para ter um descanso.

Eu não podia, pela orientação médica sair sempre com a mesma mulher. Eu tinha que conhecer diversas e mesmo se não tivesse vontade nenhuma, não podia ficar em casa, tinha que sair.

E fui indo neste embalo  até que chegou o melhor Ano Novo que já passei na minha vida.

E que foi uma perfeita desmistificação destas data..

Tinha tido um compromisso em São Paulo e estava voltando para Curitiba na noite de trinta e um de Dezembro e  estava programado que quando chegasse em Curitiba ia ligar para uma garota com quem estava saindo mais e que ficava me pegando no pé para ir conhecer a família dela.

Coisa que eu não tinha interesse nenhum, mas estava programado.

E fui chegando em Curitiba bem próximo das 23:30 e foi amadurecendo a idéia que eu iria era me dirigir à um bom restaurante e passar a noite sossegado e, principalmente, sozinho.

Era um restaurante de boa gastronomia  e que funcionava também como casa noturna, depois de certa hora.

Era bastante badalado, mas naquele horário, pelo padrão da casa, estava quase vazio, mas mesmo assim havia diversas pessoas como eu sentados em suas mesas, sozinhos, comendo ou bebendo alguma coisa.

Para mim foi uma surpresa encontrar tantas pessoas sozinhas e tranqüilas, como eu estava, como se aquela noite fosse uma noite qualquer e que depois daquela experiência, para mim, passou a ser mesmo uma noite qualquer.

Descobri que o importante é você estar bem com você mesmo e o resto não importa.

Desmistifiquei a solidão.

Terminei a minha janta e depois de dar algumas voltas de carro pela cidade fui para casa dormir o sono dos justos.
 

Em qualquer situação da sua vida procure se lembrar:
'Não é o lugar em que nos encontramos nem as exterioridades que tornam as pessoas felizes; a felicidade provém do íntimo, daquilo que o ser humano sente dentro de sí mesmo' Roselis von Sass - graal.org.br

CURITIBA, 18 DE ABRIL DE 2010