A saga dos trabalhadores

Era farta a mesa
Dos comandantes mercenários
Que esmagavam as vilas
Que invadiam e roubavam,

Enquanto gemia o sino
Que soava em lamento
Acionado por um bêbado
Amarrado às cordas do badalo,

Crianças, jovens, velhos,
Magos, bruxas, vermelho
Manchava o verde tapete,

E o céu tornara-se cinza
À vida que agora finda
Em fúnebre e sádico banquete.
/
Os sobreviventes fugiam
Cantando ao longo do caminho,
Comiam, bebiam, e dividiam
O pouco daquilo que tinham

As mulheres amamentavam
Nos seios os pequeninos,
Os homens iam na frente,
Alguns ficavam pelo caminho,

E a luta prosseguia,
De noite e de dia,
Na revolta dos trabalhadores,

Enquanto a oligarquia
De uma suja burguesia,
Servia a usurpadores.
/
Estrada dura e seca a terra,
Ruas de pedras e encostas sombrias,
A face da morte que assovia
Por trás de cada galho seco

E nas cidades que cresciam,
Templos de seitas estranhas
Espalhavam-se como ratos
Em busca de almas e barganhas,

De miséria, enriqueciam,
Impérios construíam,
Vendendo almas leprosas,

"Ao inferno!", diziam
Aqueles que resistiam
Àquela trama vergonhosa.
/
Derrubaram o rei
Depois de se fartarem
De toda sorte de pilhagem,
De todo sangue derramado,

Clamaram aos resistentes
Para reconstruir a dignidade,
Era preciso muita hombridade,
Para honroso trabalho,

Com riqueza garantida
Por gerações, à parasitas,
Impuseram ao povo a reconstrução,

E as castas dominantes
Aquietaram-se por alguns instantes,
Incapazes que são.
/
Após longos anos
Tudo foi refeito,
As águas voltaram fartas,
Os rios se encheram de peixes,

O sol rompeu a fumaça
Deixada pelos arruaceiros,
O trabalhador voltou para casa,
As vilas se encheram de gente,

Mas as seitas permaneceram,
As hostes envelheceram,
E ambas estavam vivas,

Destilaram novos venenos
Em seus porões obscenos
Junto à autocracia.
/
Ressurgiram das covas
Aqueles que estavam mortos,
Como hordas de demônios
Se espalharam pelo mundo,

Trouxeram de volta as pestes,
A miséria, a doença, e a fome,
Ao povo, deram a morte,
A elite fofoqueira do submundo.

Fartem-se de sangue, inúteis!
Sempre foram fúteis,
Serviçais e boçais,

A enxada em nossas mãos,
Resistiu à opressão,
Por cinco séculos ou mais.
/
Seguimos adiante,
Na fartura ou no agreste,
Aquilo que nos oferece
Já é nosso por direito,

Como um raio vieste,
E tal qual, partiste,
Tão rápido, cafajeste,
Frustrado, imperfeito,

Se sobrevivemos há séculos,
Em meio a um pântano fétido,
Porque fugir agora?

A sua tristeza é a história
Escrita com sangue do povo
E que assola sua memória.
/
Hoje, após dura jornada,
Não temos tempo nem vontade
De ouvir profetas malignos
Forjados nos esgotos do flagelo,

Fazemos festas populares,
Damos alma à cultura,
Batizamos com doçura
O que forjamos a martelo,

O que é nosso está cravado,
À terra, emaranhado,
Permanecemos intactos.

Somos nós os vencedores,
Apesar dos opressores,
Repetidamente fracassados.